Abstract
O presente artigo tem como objetivo perscrutar a tarefa nietzschiana de ver a arte com a ótica da vida, apresentada pelo filósofo, em 1886, como signo da unidade de sua obra. Para tanto, realizamos uma leitura panorâmica das reflexões de Nietzsche sobre a arte, buscando salientar – em meio às tensões próprias de um pensamento assistemático – os elementos que permitem que o filósofo afirme a existência de uma coerência interna a seus escritos. Nossa hipótese é que a mesma pode ser vista em algumas relações entre fisiologia e estética estabelecidas por ele ao longo de sua trajetória, principalmente, na interpretação da arte e da cultura em geral como expressões de um certo sentido – como direção ascendente ou decadente – da vida. Interessa-nos o fato dessa perspectiva fazer-se presente no período final de sua produção intelectual na ideia de fisiologia da arte, com a distinção entre criação na abundância e no empobrecimento. Além de sintetizar a problemática presente no pensamento nietzschiano desde seus escritos dos anos setenta, tal distinção é importante, sobretudo, por possibilitar que o filósofo apresente-se como alguém capaz de ver, através das expressões culturais, vida forte e fraca, ascendente e decadente, abundante e empobrecida. E é notável – como sugerimos no encerramento do trabalho – que, para fazê-lo, Nietzsche autoencena-se como um décadent que foi capaz de cura e, por isso, conquistou olhos para distinguir, o que pode ser interpretado como estratégia vinculada a seu empreendimento de crítica e transformação da cultura.