Abstract
A 27 de Outubro comemora a Igreja os santos Vicente, Sabina e Cristeta. Conhecidos como os Mártires de Évora, a eles foi erguida no século XV na cidade alentejana, no local onde se dizia terem nascido, uma ermida, ampliada no século seguinte já à conta do Município, que ainda hoje mantém a propriedade. Era-lhes também dedicada, na nave direita da Sé de Évora, uma das capelas laterais desaparecidas após a intervenção da Direcção-geral dos Monumentos Nacionais na década de 40 do século XX.A naturalidade dos santos irmãos, embora assumida pelos eborenses, sobretudo após as argumentações de André de Resende, mantém-se de difícil comprovação, sendo por muitos autores atribuída não à cidade alentejana, mas a Talavera de la Reina (Toledo). Martirizados no século IV na cidade espanhola de Ávila, São Vicente e suas irmãs aí foram sepultados e em sua honra construída uma grande basílica, expressão do reconhecimento e devoção aos chamados Santos de Ávila. Da descrição legendária das suas vidas e martírios decorre a respectiva iconografia. Tudo aconteceu em tempo do governador Daciano, enviado à Península Ibérica pelo imperador Diocleciano, que promoveu uma intensa perseguição aos cristãos. O jovem Vicente, que poderia servir de incentivo aos pagãos pelo seu comportamento cristão exemplar, foi chamado à presença de Daciano que o pretendeu convencer a sacrificar a Júpiter. Perante a recusa, mandou conduzi-lo a uma das praças da cidade e obrigá-lo a executar o sacrifício ou a ser morto. Colocado sobre o altar de pedra, esta tornou-se mole ficando impressas as suas pegadas, prodígio que deixou todos os presentes admirados e convencidos de que o Deus de Vicente era o verdadeiro. Tal facto levou Daciano a suspender temporariamente a condenação, tendo mandado o jovem para a prisão, onde foi visitado por suas irmãs Sabina e Cristeta. Convencido por elas a fugir, foram os três perseguidos e apanhados em Ávila, sendo sujeitos a vários suplícios e finalmente partidas as suas cabeças com paus e pedras. Os seus corpos foram deixados ao abandono para pasto dos animais; todavia apareceu uma enorme serpente que os protegia e que se enroscou à volta de um judeu rico da cidade que pretendia desprezar os santos despojos e que só se viu livre da serpente quando prometeu converter-se ao cristianismo. Os mártires acabaram por ser sepultados pelos cristãos, espalhando-se rapidamente a sua devoção.O repertório iconográfico, muito reduzido no que concerne a arquidiocese de Évora, confina--se praticamente à igreja de São Vicente, onde se encontra a pedra na qual supostamente terá deixado as marcas dos seus pés; alguns painéis do retábulo-mor representam “São Vicente conduzido perante o altar de Júpiter”, “São Vicente na prisão e a visita de suas irmãs”, “o martírio de São Vicente”, e “o judeu impedido pela serpente de ultrajar os corpos dos três santos”. A representação escultórica segue muito de perto a de Ávila. Todos trazem a palma do martírio, São Vicente um livro aberto ou semicerrado. As irmãs Sabina e Cristeta apresentam uma iconografia pouco definida, sendo por vezes necessário, quando não estão inseridas no contexto duma cena conhecida, que o nome lhes seja sotoposto para fácil identificação.